segunda-feira, 4 de julho de 2011

O meu (teu) desejo

        Imaginei você comigo desde a primeira vez que te observei descendo os três ou quatro degraus daquele ônibus de um tempo distante. Tempo errado, local inadequado, vontades iguais. O mesmo tempo que passou para ambos. As vidas distantes tomaram caminhos iguais e ausentes. As indiferentes investidas foram em vão. Nada mais era conversado além de um “Eu estou bem, também”. 
                O barzinho pretensioso de uma sábado à noite depois de uma sexta feira de boemias e nenhuma expectativa boa nos deixava mais próximos. Os cigarros constantes me tiravam toda apreensão depositada naquela noite. Minha boca, seca das conversas inconseqüentes e tímidas a fim de romper a barreira imposta pela timidez de ambas as partes, desejava os teus lábios embriagados que em mim despertavam os desejos mais carinhosos e descarados. Naquela situação me questionava por diversas vezes, como tomar a iniciativa e te trazer, enfim, para a minha vida. Te desejava como há tempos não desejava outra pessoa.
                 As idas ao banheiro eram disfarces idiotas para olhar o meu rosto no espelho e tentar me convencer que eu era capaz de te dizer duas ou três coisinhas bonitinhas que insistiam em ficar engasgadas ao retornar àquela mesa de um amarelo tão bonito. Elas, as palavras bonitinhas, vinham à minha mente enquanto meu sangue percorria o meu corpo numa velocidade tão mais rápida que o normal, mas minha boca não obedecia nem respeitava. Olhava os teus olhos bem desenhados na tentativa e na esperança de perceber o que acontecia comigo. Em vão. Teu olhar, ainda mais apreensivo que o meu, era displicente. Em poucos momentos nos olhávamos fixamente, para tanto, usávamos a desculpa descarada de prestar atenção no que o outro dizia.
                O jogo de olhares, toques pouco abusados e risos diversos deixavam o clima angustiante e os cigarros em minha mão cada vez mais constantes. O aviso de que aquele bar estava pra fechar, como nas mais melancólicas músicas de Bethânia, anunciava o fim do tempo para possíveis tentativas de te levar pra minha cama ainda aquela noite.
                 Desejava teu corpo, teu sexo e teu sorriso como se as pessoas em volta não mais existissem, como se aquele local fosse a minha sala de jantar na madrugada de uma sexta-feira à noite. Apenas nós, os dois.
                A proposta inocente de acabarmos a noite em minha casa se confundia com um acordo tácito entre os nossos desejos. Em casa, o som da televisão nos calava. Poucas palavras eram ditas e muitas outras engolidas. O teu anuncio de partida me veio com uma derrota das mais amargas. Escrever com as mais desenhadas letras que aquela noite não seríamos um do outro.
                Degraus, parentes distantes dos que te trouxeram pra mim um dia, te levavam de mim sem deixar rastros de volta. Te via saindo de meus planos e já imaginava o arrependimento de um fim de madrugada por não ter te pegado pelo braço e dizer olhando em teu rosto tudo que desejei durante toda a noite. Os meus planos frustrados de uma noite quase fria. Abrir o último dos portões de minha casa para anunciar a tua partida não era exatamente a última cena que queria guardar daquela noite. Num ato impensado e desesperado, contido e lúdico, segurei em teu braço em busca de uma reação qualquer. Olhou-me nos olhos como quem já esperava por aquilo há tempos. Desculpas esfarrapadas ao pé do ouvido para, então, encostar os meus lábios aos teus e te ter como havia desejado e planejado durante toda aquela noite de vontades, cigarros e planos. Um infinito de desejo num turbilhão de tempos e coisas acontecidas que não me permitia deixar-te escapar dos meus braços. Era como se todo o tempo passado daquela noite tivesse sido uma preparação masoquista para o esplendor do desejo realizado. As palavras já não mais existiam, apenas toques, corpos, desejos, planos e saudade ao te ver partir.

Um comentário:

  1. olá, a muito que não te via por aqui... a muito que não lia seu textos. Vindo aqui te digo é como beber um copo de água, o vicio é tão grande que tem de se acabar a linhas. Sabes aquele som de quem bebe um sumo com uma palhinha e faz aquele barulho no final? Assim fui eu... esgotei cada gota, cada letra para chegar ao final e dizer: grande noite, cheia de sentidos... cheia de desejos :) bj

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